Especial Virando o Jogo #01 | Por mais Dalvinas: e que virem o jogo!

10 de janeiro de 2022 - 10:17 # # # #

Ethel de Paula - Texto Queiroz Netto - Fotos

Brilho no olho, o riso tímido mas indisfarçável no rosto. Só quem viveu pode contar de viva-voz. E estimular com seu relato quem está chegando. Por isso, a convidada especial para dar boas-vindas a uma das novas turmas que acaba de tomar assento na sala de aula do Centro Educacional Dom Hélio Campos, no bairro Cristo Redentor, integrando a 3ª edição do projeto Virando o Jogo – Superação, foi Dalvina Mota Rodrigues, de 21 anos. “Sou uma pessoa antes e depois do Virando o Jogo”, adianta.

A jovem moradora do grande Pirambu acabou de concluir o primeiro ciclo formativo do projeto Virando o Jogo – Superação, que inclui formação cidadã e profissional voltada a uma parcela da juventude de Fortaleza que vive em situação de vulnerabilidade socioeconômica e até então estava fora da escola e sem perspectiva de ingresso no mercado de trabalho.

“Estava tudo fora do lugar na minha vida. Havia perdido a minha mãe, que era alcoólatra, em 2019. Meu pai morreu quando eu ainda era criança. Tenho dois irmãos e uma irmã mais nova. Até ser selecionada para o Virando o Jogo eu trabalhava aqui, acolá nas casas da vizinhança e tive que deixar de estudar para cuidar da minha mãe quando ela ficou doente e foi hospitalizada. Nessa época eu só pensava em morrer e em coisas negativas. Quando veio o projeto me senti abraçada, não só porque tinha uma bolsa para me ajudar no sustento da casa mas porque vi a chance de me profissionalizar naquilo que eu já gostava de fazer, pesquisando na internet: maquiagem”, relata Dalvina.

A maquiadora em formação que também retomou os estudos do Ensino Médio tem mais o que comemorar e compartilhar: através do projeto Virando o Jogo, que conta com o SENAC como parceiro na fase de formação profissional, Dalvina passou na finíssima peneira de seleção do Banco do Nordeste para trabalhar como Jovem Aprendiz.  Hoje, ela é uma entre 40 jovens da primeira edição do projeto Virando o Jogo – Superação que têm a alegria inconteste de receber seu primeiro salário-mínimo ao mesmo tempo em que também aprendem uma nova profissão, passando a virar o jogo da desigualdade social.

Que venham outras tantas Dalvinas. Na 3ª edição do projeto Virando o Jogo – Superação, que se estende por cinco diferentes áreas da periferia de Fortaleza, cerca de 800 jovens darão início à formação cidadã, momento em que as turmas conhecem e debatem diversos temas, como  relações interpessoais, saúde, construção de projetos de vida, entre outros, para, ao final, escolherem uma profissão e vivenciarem uma capacitação profissional naquela área. Detalhe: com direito a ajuda de custo, lanche, vale-transporte, prática de esporte e participação em ações culturais.

Boas-vindas a quem chega

Joana Jennifer, 18 anos, é da turma de novatas que chega com a 3ª edição do projeto Virando o Jogo – Superação. Não se envergonha em dizer que sonha alto e quer alçar voos cada vez maiores ao longo do processo formativo que virá. “Me interesso pela área de design e já até iniciei uns cursos livres mas tive que parar quando concluí o ensino médio para procurar trabalho avulso. Trabalhei durante cinco meses com telemarketing e quando saí não me senti nada bem em ficar desocupada, sem nada na cabeça. Então minha prioridade aqui é mesmo adquirir mais conhecimentos para poder ingressar numa faculdade futuramente e seguir para o mercado de trabalho mais bem preparada”, adianta a jovem de cabelos coloridos, atenta à explanação da equipe de assistentes sociais, psicólogas, articuladores sociais e estagiários que na tarde da última quinta-feira davam as boas-vindas à turma do CC Farol, no bairro Vicente Pinzon.

Aos 18 anos, Lucas Oliveira é outro com alta expectativa junto ao projeto Virando o Jogo – Superação. Ele que já participou como voluntário em projetos sociais no bairro de origem e busca no projeto oportunidades de trabalho que possam levá-lo primeiro a investir em um pequeno comércio para, aos poucos, alcançar o que chama de “projeto de vida maior”: estudar Direito e se tornar procurador. “O brasileiro é especialista em se virar, então acho que o projeto Virando o Jogo vai trazer pra gente ainda mais habilidades e ferramentas pra gente aprender a se virar, a fazer nossos corres até chegar a hora da grande virada, né não?”, anima-se o jovem morador do Vicente Pinzon.

“Parece impossível até que seja feito”

No CITS Mucuripe, a apresentação inaugural do combo de atividades que envolvem a 3ª edição do projeto Virando o Jogo – Superação começou com uma frase e terminou com uma lista de desejos entregue aos jovens do bairro que no momento nem estudam e nem trabalham, mas serão provocados não só a voltar para os estudos como também ter acesso às ferramentas necessárias para se iniciar em uma profissão.

“Parece impossível até que seja feito”, eis a provocação que, para Fernando Cordeiro Brito, 18 anos, o Nando, soou como estímulo a não abandonar o maior dos seus sonhos até então adormecidos. “Eu sempre sonhei em ser enfermeiro, mas já estava achando impossível, então aqui no projeto vim tentar ter uma formação na área da Administração, que é onde eu acho que posso conseguir um trabalho mais rápido. Agora tô achando que posso fazer uma coisa e outra, né? Tanto me capacitar pra trabalhar como assistente administrativo como me planejar pra chegar a fazer a faculdade de Enfermagem mais lá na frente. Não posso desistir”, encoraja-se o jovem que já trabalhou temporariamente como empacotador nas Lojas Americanas e hoje precisa ajudar a mãe, empregada doméstica, a manter a casa e a avó.

Aos 19 anos, Maria Glória chega ao projeto Virando o Jogo – Superação com um objetivo certeiro: conquistar a certificação como manicure para ampliar sua rede de clientes junto aos salões de beleza onde já trabalha de forma avulsa no bairro. E como tem filho bebê para criar e um companheiro para somar esforços na luta pela sobrevivência já vislumbra abrir o próprio negócio no ramo da beleza. Foi o que primeiro escreveu na lista de desejos. “Esse é o desejo número zero de muitos que pretendo trazer de volta lá do fundo do baú, porque como sonhar não custa nada o jovem sonha muito alto, né? Só que a dureza da vida vai fazendo a gente esquecer o que deseja mesmo para fazer qualquer coisa para sobreviver. Mas isso pode mudar”, reitera.